Ontem fui adicionada a um grupo de personagens, espaços e memórias da minha cidade, onde passei a infância e adolescência: Niquelândia, Goiás. Então, o organizador do grupo, Melk Aires, postou essa foto, perguntando se alguém já tinha comido batida de ovos caipira com açúcar e farinha. Nossa, na hora me vieram as lembranças, não pude me conter e meu comentário virou aquele "textão".
Lembrei-me de que os momentos que saboreávamos a batida de ovos era um evento lá em casa, talvez por que a nossa mãe, tão ocupada como comerciante, parava para nos alimentar , o que representava gestos de carinho, já que era muito cansativo fazer a trabalhosa sobremesa para tantas crianças. Mas mãe é igual a rapadura, né? É doce mas não é mole não!
Éramos quatro filhos e preparar a gemada batendo os ovos à mão, com garfo no prato esmaltado exigia muito esforço físico, então, minha mãe batia dois ovos num prato e dois ovos no outro e dava um prato para cada dois filhos. Como criança sempre têm o olho maior do que a barriga, acabávamos brigando: "mãe, fulano comeu mais do que eu!" Pensa a cabeça da minha mãe ouvindo isso depois da trabalheira de bater aquele tanto de ovos! Ela ficava nervosa, argumentava que fazia tudo com tanto carinho para nós, dizia também que o alimento era suficiente para os quatro e que nós éramos gulosos. Essa sequência se repetia toda vez que pedíamos a ela para fazer a batida de ovos para nós. Até o dia em que ela se cansou, óbvio. Então, não titubeou. Naquele dia, com uma decisão salomônica ela mudou a estratégia: bateu muitos ovos, mas muitos mesmo, preparou-os cuidadosamente com açúcar e farinha, dividiu-os, dessa vez, em quatro pratos: um para cada, mas um generoso prato. Nós, começamos a comer felizes da vida, nunca comíamos num prato sozinhos. Mas, para quem já comeu esse tipo de gemada, sabe que é uma delícia, mas enjoativa, então, cada um já ia diminuindo o ritmo das colheradas, até parar de vez. Nós só não contávamos com a determinação de nossa mãe para educar a nossa gula. Ela nos obrigou a comer tudo para que nunca mais brigássemos por algo que nem conseguiríamos comer tudo. E não é que serviu de lição! Não brigamos mais (pelo menos por batida de ovos) mas também não comemos mais aquela iguaria. Fiquei muito tempo sem saboreá-la, não aguentava ouvir falar em gemada que já me "repunava", como se dizia lá pras bandas de Goiás.
Então, ao ver o post do colega,encheu-me de água a boca. Senti não só o gosto da gemada, mas o sabor da infância, de uma vida simples e feliz, senti a energia poderosa da minha mãe em forma de carinho e de pulso firme na nossa criação. Senti também uma gratidão por aquela foto estar me fazendo recordar as boas memórias, que me preenchem e dizem sobre a minha origem, a minha essência, que dizem quem eu sou.
Foto: Malk Aires
Texto: Ângela Santos, mais conhecida com o seu Jeito Ângela de Ser, libriana com ascendente em Áries e Lua em Gêmeos, Gineterapeuta, Moon Mother, Terapeuta de Barra de Access, Facilitadora de Círculo de Mulheres, Estudiosa do Baralho Cigano, Mãe de três filhos e Delegada de Polícia no Distrito Federal.
Texto escrito no dia 03/05/2018, primeiramente, em forma de comentário ao post citado.